Ser autêntico é libertador
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As perdas podem promover encontros consigo mesmo ou afastamentos de si. Ao perder meu pai em 2016 e grandes amigos durante a pandemia da Covid-19, me encontrei nessa situação: se aproximar ou fugir de mim? Diante desse dilema intrasubjetivo, escolho o esforço no sentido de confrontar minhas falsas verdades. O falecimento de pessoas queridas ou os fracassos financeiros, portanto, causam choques de realidades e nos convidam à reflexão sobre si.

Nesse sentido, a leitura do livro Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, é um exercício de autoconhecimento por meio do outro, neste caso, o morto. Por exemplo, no trecho: “a fraqueza é a primeira virtude de um defunto”. (ASSIS, 2016, p. 27-28), além de contrariar, ironicamente, à expressão: “Aos vencedores, as batatas” – advindas da Teoria do Humanitismo, explicada por Quincas Borbas ao amigo Cubas – evidencia-se, também, a verdade existencial imposta pela morte e, por isso:

na morte, Que diferença! Que desabafo! Que liberdade! Como a gente pode sacudir fora a capa, deitar ao fosso as lantejoulas, despregar-se, despintar-se, confessar lisamente o que foi e o que deixou de ser (ASSIS, 2012, p. 27-28). 

Perante as circunstâncias fúnebres, portanto, as identidades entram em crise, as máscaras caem e as hipocrisias se revelam. Quem não!? Comigo: a insegurança, o medo e o choro vieram à tona (chorei muito), em resistência aos ditos patriarcais – forjados desde a infância: “homem não chora”, “seja homem com H” ou o tal “homem de verdade” entre outros. E, nessa hora, descobri que ser autêntico é libertador. 

A autenticidade tem vários sentidos, porém, o que nos interessa nesta reflexão se refere ao discurso: “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” (João 8:32), no entanto, para encontrar a “Verdade” precisamos ser um autêntico cidadão-cristão. Não se trata, nesta perspectiva, de alguma coisa dada, mas de algo a ser conquistado, num caminhar constante, honesto e transparente para o nosso interior, ou seja, uma jornada utópica de si, pois “quem pensa que sabe tudo sobre si mesmo, os outros e até sobre as verdades religiosas, terá dificuldade em encontrar Cristo”, adverte Papa Francisco. 

Conforme Mike Robbins,esse diálogo intrapessoal nos proporciona: “conexão amplificada com os outros e com nós mesmos; paz de espírito; autoaceitação; autoapreciação; amor próprio” (ROBBINS,1974,p. 21). Nos ajuda, contudo, a desapegar-se de entulhos emocionais, libertar-se de coisas que nos escravizam, atentar-se aos sequestros de palavras-prisões e relacionamentos tóxicos. Desde meus lutos e infortúnios, então, procuro saber mais de mim – para viver, dizer e fazer o que realmente importa na minha vida até chegar à liberdade definitiva.

Assim, o (a) convido a pensar: quem realmente importa para você?

Autor: Francisco Filho


ASSIS, Machado de, Memórias Póstumas de Brás Cubas, Belo Horizonte; São Paulo: Autêntica, 2012
ROBBINS, Mike, Seja Autêntico: Outras personalidades já têm dono, Td: Renato Mota, Rio de Janeiro, BestSeller, 2011.

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